sábado

Os vexames do ministro


Editorial Estadão

O governo Lula insiste em ignorar que a mentira tem pernas curtas e que não se pode escarnecer impunemente da inteligência alheia. Se já tivesse aprendido com a própria experiência, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, teria tido a precaução elementar de não brigar com os fatos à vista de todos, como faz agora, poupando-se de um duplo vexame no caso da crise da Receita Federal. De um lado, pela forma leviana como tem se manifestado sobre o conflito sem precedentes em um dos mais importantes setores do Estado nacional. De outro, pelo desmentido - pelos fatos - das suas alegações para justificar a demissão da então titular do Fisco, Lina Maria Vieira, em julho último. Ela foi nomeada por motivos políticos; passados 11 meses, foi removida por motivos políticos.

É impossível subestimar a gravidade da rebelião na Receita, que já levou cerca de 60 servidores de elite a entregar os seus cargos. Entre eles, os superintendentes e coordenadores que subscreveram um documento denunciando a "clara ruptura com a orientação e as diretrizes" do órgão na gestão do novo secretário Otacílio Cartaxo. Eles sustentam que o rompimento atingiu o próprio "projeto de atuação do órgão", que dava prioridade à fiscalização sobre os chamados grandes contribuintes. Mantega não apenas qualificou a denúncia como "balela", mas a considerou "uma desculpa para encobrir a ineficiência" da administração Lina Vieira. Com isso, fez o que o presidente Lula queria evitar a todo custo - ou seja, polemizar, ou, como teria dito, "bater boca" com a ex-secretária.

Lula tem bons motivos para temer que a opinião pública a veja como vítima de humilhações, em represália por haver confirmado rumores de que, em fins do ano passado, foi chamada pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, para uma conversa em que ouviu um pedido para "agilizar" a investigação sobre as finanças do empresário Fernando Sarney, o filho do presidente do Senado. Dilma nega o encontro e o pedido. À inconveniência, Mantega acrescentou a balela de declarar que "a Receita está funcionando na normalidade" e que "está se criando a ideia falsa de que há confusão". Não é a primeira vez e decerto não será a última em que Lula e seu pessoal apelam para a teoria da marolinha, na tentativa de minimizar perante a opinião pública a ameaça de um tsunami.

Em um governo menos confiante na inabalável popularidade de seu chefe, o ministro ao qual responde uma instituição da importância do Fisco estaria com a cabeça a prêmio pela incapacidade de prevenir o desastre. Mas não há o que abale a autoconfiança do nosso Guia Supremo. Mantega não vai mudar apenas porque a sua versão, de que Lina Vieira perdeu o lugar porque a sua alegada ineficiência derrubou a arrecadação, acaba de ser desmoralizada por um órgão da própria administração federal - aliás, criticado por sua excessiva fidelidade à ideologia petista.

Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) demonstra com números singelos que a arrecadação caiu, como todo mundo sabe, devido à retração da economia e à política de desonerações tributárias para estimular o consumo. No primeiro semestre, a receita da União diminuiu R$ 26,5 bilhões em comparação com o mesmo período do ano passado. Desse total, R$ 15,5 bilhões correspondem às desonerações e compensações tributárias adotadas por empresas como a Petrobrás.


Mas, no imbróglio da Receita, que inclui o episódio da reunião entre Dilma Rousseff e Lina Vieira, as desavenças do governo com a verdade vão além do palavreado de Mantega. Na semana passada, instado a dar acesso às imagens do entra e sai no Palácio do Planalto que poderiam provar que a ex-secretária, como assegura, ali esteve para se encontrar com a ministra no final de 2008, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Jorge Armando Félix, argumentou que as gravações já não existem porque são armazenadas por apenas cerca de 30 dias. A explicação foi posta em xeque.

O site Contas Abertas revelou que o edital para a contratação da empresa fornecedora dos equipamentos do sistema de segurança palaciano estipulava que os registros deveriam ficar guardados em um banco de dados por 6 meses no mínimo - e, depois, "transferidos definitivamente para uma unidade de backup". Terá o governo descumprido as suas próprias regras ou procura poupar a candidata de Lula do confronto com os fatos? Fonte


Duro, Lula cobrou apoio de Mercadante às decisões do governo

Presidente disse que não admitia ser pressionado e distribuiu broncas; carta foi acertada na madrugada

Em longa e dura conversa com o líder do PT no Senado, Aloizio Mercadante (SP), na noite de quinta-feira, 20, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cobrou do petista apoio às decisões do partido e do governo, disse que não admitia ser pressionado e distribuiu broncas. Irritado com a atitude de Mercadante de anunciar pelo Twitter - site de microblogs - que apresentaria na sexta-feira sua renúncia à liderança do PT, em caráter irrevogável, Lula afirmou que, além de fazer jogo individual, o senador estava cometendo grave erro político.

"Não pense que a militância do PT vai entender isso", esbravejou ele, no Palácio da Alvorada. O presidente não escondeu de Mercadante que ficou furioso com o fato de o petista ter anunciado que conversaria com ele, jogando a solução do imbróglio em seu colo. Foi por isso que deixou "vazar" a informação de que não ligava para a renúncia e aprovava a escolha do senador João Pedro (PT-AM) para a vaga. Suplente do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, João Pedro é amigo de Lula e preside a CPI da Petrobrás.

"Em política não existe a palavra irrevogável", disse Lula a Mercadante. Apesar do tom amistoso da nota em que o presidente pede ao líder do PT para não abandonar a liderança do partido, os dois bateram boca em mais de uma ocasião durante a conversa de cinco horas, que entrou pela madrugada de sexta-feira.



Os termos da carta de Lula a Mercadante foram acertados naquela noite para dar argumento ao recuo do senador. O texto passou pelo crivo do ministro da Comunicação Social, Franklin Martins. Antes de viajar para o Acre, na manhã da sexta, o presidente telefonou para o petista e o autorizou a ler a carta da tribuna do Senado. "Está tudo bem. Tivemos uma boa conversa", afirmou ele, mais tarde, a auxiliares.


Na quinta à noite, porém, Lula disse a Mercadante que a renúncia seria imperdoável. No seu diagnóstico, além de jogar combustível na crise que pôs em rota de colisão o governo, a bancada do PT e a direção do partido, o gesto daria munição aos adversários e seria visto como resultado da luta entre éticos e não-éticos do PT sobre o destino do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).

Diante do presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), que participou da conversa, Lula afirmou que Mercadante não tinha o direito de levar mais desgaste para o partido. Disse, ainda, que um líder não podia jogar a toalha nem desistir de sua missão na primeira dificuldade. "O presidente não fez um apelo. Fez, na verdade, um chamamento à relação de 30 anos que tem com Mercadante", contou Berzoini.

O senador reagiu às cobranças de Lula e foi duro nas críticas. Afirmou que o PT e o governo "erraram muito" ao recomendar o arquivamento de todas as denúncias contra Sarney. Garantiu, ainda, que não estava jogando para a plateia nem adotando posição dúbia, de olho na sua própria reeleição, em 2010, ao defender a abertura de investigações no Senado.

Mercadante argumentou que a maioria dos senadores sempre defendeu o afastamento de Sarney e que não leu a nota na qual Berzoini orientava os três integrantes do Conselho de Ética a salvar Sarney porque aquele enquadramento feria os seus princípios.

Vera Rosa e Tânia Monteiro, de O Estado de S. Paulo

terça-feira

Uma empreiteira no circuito


Editorial Estadão

O que mais chama a atenção nas impropriedades do clã Sarney que não cessam de vir à luz é a despreocupação com as marcas comprometedoras de suas ações. Pessoas comuns, como disse o presidente Lula para delas distinguir a especial figura do senador maranhense, geralmente cuidam de salvar as aparências para encobrir os vestígios de suas malfeitorias. Sabem quando as cometem e sabem que algum risco existe de serem chamadas a prestar contas por isso. As outras, aleitadas na cultura do privilégio, praticam impropriedades, ou coisa pior, com uma desenvoltura que só se explica pelo senso da própria incolumidade. De reincidência em reincidência, acabam perdendo a noção do certo e do errado, transformando a imoralidade em amoralismo. O que se publicou nos últimos meses sobre a abastada crônica dos desvios de conduta do atual presidente do Senado - e os seus protestos de inocência em relação a cada um deles - se encaixa nessa perspectiva: o nepotismo, os favores aos apaniguados, as lambanças com recursos alheios, a apropriação privada de bens públicos. Em suma, os traços inconfundíveis da política patrimonialista à sombra da qual percorreu uma trajetória de 55 anos que ele hoje invoca para se considerar inimputável. Se tudo é natural, que mal haveria em recorrer a uma empreiteira para comprar "secretamente" imóveis para uso da família? E que mal haveria no fato de essa empreiteira fazer excelentes negócios no setor elétrico? Decerto a presença de apadrinhados de Sarney em postos decisivos do setor não tem nada que ver com isso. A história chega a ser singela. Em 2006, a família resolveu ter mais dois apartamentos no prédio da Alameda Franca, em São Paulo, onde é dona de um pied-à-terre desde 1979, em nome de Fernando Sarney. Num caso, o proprietário do apartamento 22 foi procurado pelo neto do senador, o economista José Adriano Cordeiro Sarney, filho mais velho do deputado Sarney Filho, o Zequinha. (José Adriano frequentou recentemente o noticiário como sócio da empresa que intermediou R$ 1,2 bilhão em empréstimos consignados junto a 20 instituições bancárias para funcionários do Senado.) Dias depois, entrou em cena Maria Rosane Frota Cabral, irmã e sócia de Rogério Frota na empreiteira Aracati Construções, que hoje se chama Holdenn Construções. Rogério, um cearense radicado no Maranhão, se tornou amigo próximo de Zequinha. "Por alguma razão, não queriam que o sobrenome Sarney aparecesse", percebeu o vendedor, que passou a escritura no saguão do Aeroporto de Congonhas a um tabelião de Sorocaba. No segundo caso, dez meses depois, sabendo que outro proprietário pensava em vender o seu apartamento, o 32, o zelador do edifício o abordou. "Ele me disse que o senador Sarney, que já tinha dois apartamentos no prédio, queria um terceiro, para um assessor dele", contou ao Estado. A partir daí, o padrão se repetiu: depois de uma visita do empreiteiro Frota, a sua irmã fechou o negócio e passou a escritura com o mesmo tabelião de Sorocaba. Os dois imóveis foram e continuam registrados em nome da Aracati. Zequinha diz que o dono de fato do 22 é ele e que o declarou à Receita - uma anomalia. Diz também que o 32 "não nos pertence". Não é o que acham os moradores e funcionários do edifício. E o próprio senador se hospedou nele em junho, quando ficou em São Paulo acompanhando a convalescença da filha Roseana depois de uma operação. Mas o que os Sarneys dizem muitas vezes não passa pela prova dos fatos. Depois que este jornal revelou, em 10 de junho, o escândalo dos atos administrativos secretos no Senado, o titular da Casa afirmou textualmente: "Eu não sei o que é ato secreto." Na sexta-feira passada, o ex-diretor de Recursos Humanos Ralph Siqueira relatou ao Estado que, em fins de maio, falou a Sarney da existência dos atos secretos. "Ele sabia", contou. O senador, portanto, mentiu - como havia mentido ao negar que tivesse poderes decisórios na fundação que leva o seu nome, da qual foram desviados R$ 500 mil de um patrocínio de R$ 1,3 milhão da Petrobrás. Os atentados de Sarney ao decoro parlamentar se acumulam, portanto. Há menos de dois anos, convém lembrar, Renan Calheiros teve de renunciar à presidência da Casa para não ser cassado depois que se descobriu que o lobista de uma empreiteira pagava despesas da mãe de um de seus filhos. "Quantas denúncias mais ele aguenta?", pergunta o senador Demóstenes Torres.

domingo

Empreiteira pagou dois imóveis para família Sarney em SP

Foto Paulo Liebert/AE. Apartamento fica na Alameda Franca, nos Jardins


Negociação de apartamentos em área nobre foi feita por empresa de amigo dos filhos do senador

BRASÍLIA - Há três décadas, a família Sarney tem como endereço em São Paulo o edifício Solar de Vila América, situado na Alameda Franca, nos Jardins. Até 2006, era um apartamento apenas. Hoje, além do apartamento número 82, comprado em 1979, a família tem a sua disposição outras duas unidades.Os apartamentos 22 e 32 foram comprados há três anos. São usados pelos Sarney, mas estão registrados em nome de uma empreiteira, que cuidou da negociação e pagou os imóveis.

A empreiteira é a Aracati Construções, Assessoria e Consultoria Ltda, cujo dono é o empresário Rogério Frota de Araújo, amigo dos filhos do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). De acordo com os registros da empresa na Receita Federal, a Aracati - cuja razão social foi formalmente alterada para Holdenn Construções, Assessoria e Consultoria - tem hoje como principal nicho de negócio o setor elétrico, área do governo federal em que Sarney exerce influência. Há dois anos, a empresa começou a atuar em projetos de construção de usinas termoelétricas... Rodrigo Rangel, de O Estado de S. Paulo

Veja também:

linkFamília de senador e empresário não se manifestam sobre transação

Campanha Ficha Limpa já tem mais de 1 milhão de assinaturas

Do site Congresso em Foco

Mais de 1 milhão de pessoas já assinaram o projeto de lei de iniciativa popular que dificulta a candidatura de políticos com maus antecedentes, os chamados fichas-sujas.

A Campanha Ficha Limpa é coordenada pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), formado por 42 entidades, dentre as quais a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

A campanha deu origem a cerca de 300 comitês, que já conseguiram colher até o momento mais de 1 milhão de assinaturas. Para o projeto começar a tramitar no Congresso, ele precisa de 1,3 milhão, 1% do eleitorado nacional.

"Como não há aqui juízos de valor sobre a culpa do pretendente ao registro de candidatura, não há que se falar em presumir-se ou não a sua inocência. A decisão do foro eleitoral baseia-se objetivamente na existência da sentença criminal, não subjetivamente na possível culpa do réu", explica o juiz Marlon Reis, coordenador do movimento, em artigo para o Congresso em Foco.

O MCCE foi responsável pelo primeiro projeto de iniciativa popular que se transformou em lei no Brasil: a Lei 9.840, que proibiu a compra de votos e o uso eleitoral da máquina administrativa. Ela completará dez anos agora em setembro.

Segundo levantamento do Congresso em Foco, durante todo o período da legislatura passada (2003/2007), 206 deputados e senadores responderam a processos no Supremo Tribunal Federal. Em junho deste ano, 150 congressistas apareceram como réus de 318 processos em andamento no STF. Ou seja: de cada quatro parlamentares no exercício do mandato, um responde a acusações formais naquela corte. Crimes contra a administração pública, crimes eleitorais, tributários e financeiros predominam entre os ilícitos atribuídos aos deputados e senadores.

Para aderir à campanha Ficha Limpa, é preciso entrar no site do MCCE, imprimir o formulário, recolher assinaturas e depois enviar para o endereço indicado no próprio documento.

terça-feira

Estadão é novamente citado em ação de censura

BRASÍLIA - Nesta segunda-feira, 10, o Estado foi citado - pela segunda vez e mais uma vez a mando do próprio desembargador - na ação que censurou o jornal a pedido de Fernando Sarney, filho do presidente do Senado Federal, José Sarney. Com isso, em que pese o fato de o desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça (TJ) do Distrito Federal, ainda não ter decidido sobre sua própria suspeição, o jornal foi duplamente notificado da censura.

Autor da decisão que censurou o Estado, DácioVieira proibiu a veiculação de reportagens e gravações no jornal O Estado de S.Paulo e no portal estadao.com.br sobre a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que investiga Fernando Sarney. Ao conceder o pedido de liminar, ele determinou que o jornal receba uma sanção pecuniária de R$ 150 mil por reportagem publicada se violar a sua decisão.

No pedido de suspeição protocolado na quarta-feira passada, os advogados do Estado sustentaram que o desembargador tem relações de amizade com Fernando Sarney e pedem que Vieira se declare suspeito de tomar decisões no processo em que é parte Fernando Sarney.

De acordo com informações do TJ, nenhuma outra decisão sobre o caso poderá ser tomada pelo tribunal até que o desembargador analise o pedido de suspeição feito pelos advogados do jornal. Nem mesmo a 5a. Turma do TJ poderá analisar o mérito do agravo de instrumento em que é discutida a proibição da publicação de reportagens e gravações sobre a Operação Boi Barrica.

Se o desembargador usar integralmente o prazo de dez dias para analisar o pedido do jornal, a decisão somente deverá ser tomada em 17 de agosto.

sexta-feira

Gente que mente



terça-feira

Mordaça: O ocaso do patriarca

Editorial Estadão

O senador José Sarney voltou do recesso parlamentar mais fraco do que nele entrou. Ao contrário do que desejava, as duas semanas de férias do Congresso, terminadas ontem, não arrefeceram as labaredas que incineram a sua pretensão de continuar na presidência da instituição a qualquer custo. Foi nesse período, aliás, que se abateu sobre ele a mais contundente da sequência de revelações que expuseram a contumácia com que o seu clã se entrega à alquimia de transformar bens públicos em patrimônio particular - as gravações transcritas neste jornal em que Sarney e o seu filho Fernando aparecem arranjando um emprego no Senado para o namorado da neta. A publicação das conversas colocou o Estado sob censura prévia por decisão, a rogo do filho, de um desembargador do Distrito Federal, Dácio Vieira, relacionado com o oligarca maranhense.


Politicamente, a iniciativa apenas serviu para apressar o ocaso do patriarca, até mesmo na bancada senatorial do PMDB, na qual as manifestações de fidelidade a ele já coexistiam com cálculos de conveniência sobre a sua sucessão no comando da Casa. Tanto que, na última quinta-feira, Sarney cobrou da direção do partido um ato formal em sua defesa. Disso resultou uma nota literalmente exemplar - exemplo de como se constrói a política nacional nestes tempos de vale-tudo da aliança lulista - assinada pelo presidente licenciado da legenda, Michel Temer (a quem Lula acenou com a chance de ser o candidato a vice na chapa da ministra Dilma Rousseff), e por sua substituta, a também deputada Íris de Araújo, que investe contra os senadores peemedebistas dissidentes Jarbas Vasconcelos e Pedro Simon, embora sem citá-los pelo nome. Dá ainda uma explicação antológica para o notório apetite da sigla por cargos no Planalto.

Pretendendo ser ferina, a manifestação consegue ser patética ao propor que deixem o partido, que ficaria mais "coeso e musculoso" sem eles. "O PMDB", diz a nota, "acata com humildade o descontentamento de alguns poucos integrantes que perderam espaço político e apostaram na fama efêmera oriunda de acusações vazias." De fato, espaço eles perderam, na razão direta da densidade de suas acusações a uma agremiação que nada mais é do que um movimentado balcão de negócios - quaisquer negócios, naturalmente. Mas o descaramento mais refinado está na alegação de que a legenda não mercadeja espaços no governo, com tudo que se lhe segue. "Os cargos públicos são apenas consequência de ideais convergentes" (sic), explicam os signatários da patranha. Deve ser em nome desses altos objetivos que o partido, ao que se diz, pedirá mais convergência a Lula para compensar a provável perda da presidência do Senado.

No grande grotão em que o dono dos cargos e os seus concupiscentes aliados transformaram a política brasileira - com a promessa de mais do mesmo se cerrarem fileiras em torno da candidatura Dilma -, as práticas da família que enfeudou o Maranhão estão inscritas na ordem natural das coisas. Quantos hão de ter ficado surpresos, por exemplo, com a decisão da Polícia Federal de indiciar o empresário Fernando Sarney por lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e tráfico de influência? Com característica mentalidade, Sarney-pai imaginou que, ao ocupar a principal cadeira do Senado, protegeria o primogênito dos efeitos da investigação policial, a Operação Boi Barrica. E este, com característica truculência, já tentara fazer a sua parte. Documentos do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) revelam que no ano passado ele encaminhou três pedidos ao órgão.

Primeiro, que convocasse um repórter deste jornal a identificar as fontes em que se baseou para informar que Fernando corria o risco de ser indiciado. Segundo, que bloqueasse o acesso do Estado às apurações em curso. Terceiro, que proibisse os procuradores federais de dar entrevistas. Foi o seu lance inicial na tentativa de amordaçar a imprensa. Mas o CNMP aprovou por unanimidade o parecer do relator, Diaulas Ribeiro, contrário aos pedidos. "Não se pode confundir observância do segredo de Justiça com censura prévia", argumentou. "A censura prévia é proibida pela Constituição Federal." Fernando voltaria à carga três vezes em diferentes instâncias do Judiciário. Na terceira tentativa, acertou - à maneira de um bumerangue, no entanto, para a situação política do pai.